PAVERAMA: Mãe de vítima da Boate Kiss preferiu não acompanhar o julgamento

Moradora da localidade de Santana, na divisa entre Paverama e Fazenda Vilanova, Diana Tischer, 54 anos, não foi a Porto Alegre assistir ao julgamento dos réus do caso Boate Kiss, encerrado na semana passada. Sua filha mais velha, Fernanda Tischer, faleceu, aos 21 anos, na tragédia do dia 27 de janeiro de 2013. A paveramense preferiu acompanhar o júri de casa, pelos noticiários, sem esperança de justiça. Para ela, a lista de réus deveria ser mais extensa.

“Acompanhar para quê? A história toda a gente já sabe de cor e salteada. Manda quem pode e obedece quem precisa. A lei é feita para o pequeno e, para os grandes e amigos, se dá o famoso jeitinho brasileiro. Eu não achava que a justiça seria feita, porque a primeira coisa que fizeram foi inocentar a Prefeitura, que deu o alvará e deveria fiscalizar. Aí já não tinha muito mais o que esperar”, desabafa. Para ela, a condenação dos réus não alivia a dor de forma alguma. “Está feito. Não vai trazer a minha filha de volta. E agora eles vão recorrer e vai levar mais nove anos”, considera.
Diana acredita que acompanhar o julgamento ao vivo a abalaria psicologicamente ao reviver a tragédia. Prefere seguir seu caminho, um dia de cada vez. “A gente perde um pouco o encanto pela vida, porque para tudo se dá um jeito, falta de dinheiro, problemas, mas para a morte, pode ir lá gritar e espernear que não muda. Dá muita saudade. Eu vivo um dia de cada vez, não faço mais muitos projetos e procuro ter paz interior para conseguir seguir a vida”, relata.
Fernanda era a filha mais velha e buscava o sonho de se tornar veterinária. Ela estava no segundo semestre do curso, trabalhava em uma empresa de assessoria do ramo e morava em um apartamento próximo à universidade. No final de semana anterior à tragédia, esteve em Paverama com a família. Diana lembra que, na data do incidente, a filha mais nova, Thaís, e o genro planejavam viajar para Santa Maria. Fernanda acabou cancelando, pois iria trabalhar no sábado, e remarcou a visita para o Carnaval, quando estaria de folga. “Eu poderia ter perdido todo mundo”, emociona-se a mãe. No dia da tragédia, a paveramense havia trabalhado e, posteriormente, se arrumou com uma amiga para ir à festa. Uma foto das duas, minutos antes do evento, estava no celular da jovem. Diana imprimiu a imagem e a guarda junto a outras fotografias da filha. A festa na Boate Kiss era realizada para angariar fundos para a formatura de várias turmas da universidade, entre elas, a de Fernanda e da amiga. As duas faleceram na tragédia.
Diana conta que busca lembrar as coisas boas que a filha gostava de fazer, que estava realizando seu sonho de ser veterinária e de trabalhar com os animais, e que, quando vinha a Paverama, adorava mexer nas roseiras da casa, visitar amigos e familiares. “Ela era o meu esteiozinho. Quando o Moacir (pai de Fernanda) faleceu, ela tinha 15 anos, foi meu porto seguro, porque a Thaís tinha 8 anos na época. Aí, quando a Nanda se foi, a coisa caiu de novo. A gente imaginava as crianças crescendo, que um dia íamos fazer isso e aquilo, e daqui a pouco a família era só eu e a Thaís”. Moacir, pai de Fernanda, também morreu de forma trágica, seis anos antes do incidente na Kiss, quando caiu do telhado do tambo de leite da família.
Diana relata que, para enfrentar o sofrimento, buscou terapias e lê muito sobre budismo e hinduísmo. “Eles não dizem como os ocidentais: ah, se eu tivesse feito diferente. Não. Se tu foi por ali é porque era para ser, nada é por acaso, pensa dali em diante, não bota o pensamento para trás. Acabei me apegando muito nessa filosofia, porque igual tu não vai conseguir voltar para trás para resolver”.