Foi junto da atividade de barbeiro que Eraldo Heberle de Freitas, natural de Estrela, dedicou-se, desde muito jovem, a uma das suas paixões: a arte. Quem frequentava o seu estabelecimento, que funcionou na rua 7 de Setembro e na David Canabarro, no Centro de Taquari, fazia uma imersão na música, na pintura e no cinema. “Se a pessoa ia fazer a barba, tinha que ouvir a música que ele gostava. A profissão de barbeiro ele herdou do meu pai e que foi o sustento dele na época, mas se pudesse, teria vivido de arte”, recorda a irmã de Eraldo, Solange Coutinho.
Ele trabalhou por 15 anos no Cine Theatro São João projetando filmes, tinha uma discoteca de Long Plays (LP) com mais de mil exemplares e pintava quadros, confeccionando, inclusive as telas e os cavaletes. “Era uma coisa nata, nada que tenha desenvolvido através de estudos. Ele não tinha condições financeiras de frequentar cursos de Belas Artes, que sempre foi um desejo, e não era ligado só à pintura, mas a tudo o que se referia à arte”, destaca Solange, que tem em sua casa cerca de 10 obras do irmão. Outras tantas estão com os amigos e demais familiares a quem Eraldo presenteava ou vendia. Os trabalhos na maioria são criações de paisagens contendo água, o que para a irmã, remetia à paz. Apenas a Lagoa Armênia, um dos pontos turísticos de Taquari, foi retratada em vários ângulos. “Ele era encantado pela lagoa. Lembro de ele ir pra lá com a tela e o cavalete pra pintar”, conta Solange.
Uma das obras da Lagoa Armênia está com Paulo Jadiel dos Reis Cananea 75 anos, que reside em Porto Alegre, que é um admirador da obra de Eraldo. “Ele era muito inteligente e acima das mentalidades da época, um ser excepcional, autodidata em pintura de telas”, diz. Cananeia tem buscado, através da rede social, reunir as obras de Heraldo e guarda uma coletânea de textos produzidos e narrados no espaço “Álbum da Saudade”, no Programa “Cidade Aberta”, de Pedro Freitag, na Rádio Açoriana.
Sonho era fazer da arte uma profissão
Eraldo nasceu em Estrela e passou a morar em Taquari ainda criança. “Acredito que antes dos seis anos, porque ele contava sobre a enchente de 1941. Quando passei a pesquisar, nem ele nem a mãe tinham mais estes detalhes. Era uma outra época em que nada era registrado”, diz Solange. Desde cedo, Eraldo teve que assumir o cuidado com a família. Com a morte do pai, recebeu o encargo de continuar a criação dos irmãos que eram muito pequenos. Sem qualquer influência, começou a pintar desde jovem, porém muita coisa não foi identificada com a data. As assinaturas também ora eram Freitas ora Heberle.
Ele faleceu em 1998, em decorrência de infarto repentino e foi sepultado no dia do seu aniversário de 64 anos. Foi um dos fundadores da Sociedade Carnavalesca Irmãos da Opa e desenhou o símbolo que a escola carrega até hoje, a taça com o folião dentro.
Após duas décadas da morte do irmão, Solange o vê com muita admiração. “Numa época em que ele lutava com dificuldades, conseguiu produzir a obra e o material. Foi um talento desperdiçado. Mas muitas pessoas reconhecem e fazem esta homenagem a ele, que teria sido mais feliz se pudesse ter se dedicado somente à arte”.
Como forma de homenagem, a família deixou escrito em sua lápide no Cemitério Municipal uma das frases preferidas de Eraldo, que manifestava o seu desejo: “Fiz da pintura uma arte, mas não fiz da arte uma profissão”.